quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

Leveza

Chego ao final do ano mais leve. Deixo para trás meses difíceis, noites longas e dias de incerteza. Voltar dói, e muito, mas eu só consegui entender isso quando resolvi encarar a dor.

"As pessoas não se dão conta que retornar é, na realidade, uma nova migração. Já não se é mais aquele que foi e o que ficou também mudou", explicou em entrevista ao jornal Valor Econômico a psicóloga Sylvia de Biaggi, autora do livro Psicologia, E/Imigração e Cultura. Graças ao trabalho desenvolvido pela equipe dela na USP, entendi o quanto a readaptação é custosa. Mais que isso. Compreendi o porquê da latente sensação de desencaixe.

"Índivíduos são socializados em uma cultura e vão morar depois em uma outra. Isto envolve uma sequência de processos muitas vezes únicos ao fenômeno imigratório, que podem ser compreendidos ao utilizarmos o conceito de aculturação. Nesses encontros e desencontros culturais, o sentido da vida é posto em xeque, ocorre um complexo processo de negociação relativo a quem se é, ou seja, a própria identidade, os próprios valores, a identidade grupal envolvendo questões étnico-raciais, vivência do preconceito, educação dos filhos, relações familiares, questões intergeracionais e de gênero, enfim, uma gama de questões relativas à própria existência humana."

Os pontos de interrogação continuam aqui, cobertos de longas madeixas pretas. Viver com todos eles tem sido um desafio diário e estimulante, mas agora, em vez de tentar assassiná-los, vou aprendendo que eles são parte da minha vida. Convivemos harmoniosamente após um acordo formal. Eu paro de planejar a execução sangrenta deles e eles me dão trégua em alguns momentos do dia.

O cessar-fogo, por enquanto, está dando certo. E em vez de ver o copo meio vazio, estou voltando a vê-lo meio cheio. Deve ser o espírito natalino. Ou a musiquinha medíocre de fim de ano da Globo.

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